Grito foi reafirmado por cerca de 180 lideranças da região, reunidas durante a primeira plenária presencial realizada após a pandemia da Covid-19, nos últimos dias 27 e 28, em formato híbrido. Momento foi dedicado à construção de uma carta com as principais políticas públicas de convivência com o Semiárido, direcionada às/os candidatas/os às eleições 2022.
Retomar, em curto prazo, o Programa Cisternas, que, desde 2016, vem perdendo recursos e no ano de 2021, entregou o menor número de tecnologias: 4.305, e executou o orçamento mais baixo da sua história, pouco mais de R$ 29 milhões. Resgatar os Programas Uma Terra e Duas Águas (P1+2) e de Aquisição de Alimentos (PAA) nos moldes que atendem às pequenas famílias agricultoras do Semiárido. Essas são algumas das prioridades políticas da ASA para 2023, definidas na primeira plenária realizada após a pandemia da Covid-19, nos últimos dias 27 e 28 de maio, realizada em formato híbrido, sendo que o grupo presencial se reuniu no Hotel Campestre, no bairro de Aldeia, município de Camaragibe, localizado na Região Metropolitana do Recife.
No documento devem constar ainda pautas como a defesa do recaatingamento como forma de mitigar os efeitos das mudanças climáticas, especialmente a desertificação, recuperando os solos e as fontes de água do Semiárido. Além disso, devem estar presentes propostas de acesso das famílias agricultoras aos projetos de produção de energia limpa e a ampliação da agenda de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. O coordenador Executivo da ASA Brasil pelo estado da Bahia, Cícero Félix, considera o momento decisivo. “É a luta da democracia contra a Ditadura. Em síntese, da vida contra a morte", sentenciou.
A fala de Cícero foi antecedida por uma explanação da ex - ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, Tereza Campello, que falou sobre os desafios para a retomada das políticas de convivência com o Semiárido. Ela reconheceu a ousadia e a força da ASA ao se desafiar e construir mais de um milhão de cisternas no Semiárido. Afirmou que o fato da fome no Nordeste não ser maior do que na região Sudeste, segundo dados da última pesquisa da Rede PENSSAN, é fruto do trabalho da ASA, mas reconheceu os retrocessos dos últimos quatro anos. “De novo, a fome é resultado do desmonte das políticas públicas”, afirmou.
Olhando para o futuro, Tereza reconhece a urgência na retomada das políticas de convivência como Semiárido, mas considera que os desafios são enormes e entre esses desafios está a retomada da agenda de políticas públicas, partindo do ponto no qual tudo foi interrompido, em 2016. “É preciso recriar o ambiente de governabilidade, inicialmente. Reconstruir uma nova agenda de direitos, não é a agenda da Década de 90. Reconstruir as políticas públicas não será trivial, talvez reconstruir o processo de construção das cisternas, sim”, avalia a ex- ministra.
A reversão de medidas que fecharam o cerco para as políticas sociais, que incluem a região do Semiárido, também serão prioridades da ASA. Entre estas a Emenda Constitucional do nº 95 que criou o teto de gastos para áreas prioritárias como educação e saúde. “Adotar uma política de retomada da valorização do salário mínimo e retomar as agendas amplas do Plano Nacional de Combate à Desertificação e de Segurança Alimentar e Nutricional”, acrescentou Cícero.
Debate e poesia - “A justiça virá da nossa mão, resgatar o Brasil daqui pra frente”. Os versos são da poesia de Caio Menezes, uma das muitas que intercalaram os debates e painéis da plenária. O texto deixa bem claro: o momento das eleições é decisivo para o Semiárido e o voto consciente nunca foi tão importante. Formada por mais de 3 mil organizações, que defendem, propõem e implementam políticas públicas de convivência com o Semiárido, a ASA é autora do projeto de convivência com a região, em vigor há mais de 20 anos. A plenária contou com representantes dos nove estados do Nordeste e da região Norte de Minas Gerais.
Na manhã do dia 26, primeiro dia de atividades, cada estado apresentou os seus desafios internos traçados ao longo de reuniões estaduais, realizadas antes da plenária. Dentre as demandas apresentadas, foram citados como sendo fundamental enfrentar as fake news e combater a volta da fome, refletir sobre o desmantelamento das políticas de convivência com o Semiárido, no âmbito nacional, e pensar ações para retomar o desenvolvimento da região.
Também foi considerada como prioridade fortalecer as redes de sementes da resistência e trabalhar o reuso de águas cinzas. O fortalecimento da agroecologia foi outra questão apontada como prioridade nos debates estaduais. Por fim, o grupo também discutiu a questão das novas matrizes energéticas. Nessa direção, uma das propostas apontadas consiste em incidir para que as unidades de energias renováveis, como as usinas de placas solares e parques eólicos, não causem impactos de desmatamento e destruição de territórios e sucessão da agricultura familiar camponesa.
Algo comum em todas apresentações, foi o sentimento de esperançar que surgiu do reencontro presencial e da possibilidade mais próxima de ver as políticas de convivência com o Semiárido sendo retomadas. E foi este sentimento que serviu de mote para a poeta Rejane Silva, da ASA Piauí, que recitou o poema “É tempo de amor”, de autoria de Bruna Silva.
“É sempre tempo de amor porque a ousadia e a coragem não se enterram. Podem invadir ou depredar lugares, podem nos bater, nos perseguir, nos ameaçar, não podem nos impedir de sonhar e de lutar” diz um dos versos, celebrado com aplausos e euforia pelas lideranças.
A tarde do dia 26, primeiro dia de programação, foi dedicada à realização de debates em grupos, voltados ao aprofundamento das questões apontadas nas plenárias locais. Quatro eixos temáticos, reúso de água, matriz energética e terra e territórios, direcionaram esses trabalhos, que envolveram participantes nos formatos online e presencial.
Na primeira temática, uma das propostas consiste em ampliar o número de famílias com acesso às tecnologias de reúso de água cinza. No eixo Terra e Território, defendeu-se a titulação obrigatória das terras das famílias que possuem cisternas. Uma das propostas do grupo de trabalho Matriz Energética é realizar um estudo sobre energias renováveis, e um diagnóstico e sistematização de experiências bem sucedidas, envolvendo as comunidades locais, onde projetos desta finalidade são implementados.
Fomentar casa, terreiro e quintal - Outro momento especial reuniu as mulheres presentes na plenária. Em um documento específico, elas defenderam que políticas de gênero fossem incorporadas à carta política, entre elas o combate à violência doméstica e à fome, além da retomada do Programa Cisternas, com o intuito de combater a escassez hídrica, que afeta particularmente as mulheres. No ato de entrega das propostas, entoaram o coro “fomentar casa, terreiro e quintal, para garantir três refeições ao dia e acabar com a carestia!”.
A agrônoma e integrante do Centro Feminista Oito de Março, Ivi Dantas, completou: “Viva à luta das mulheres! E que a gente possa ter um recomeço de muita energia e de muita transição agroecológica para o próximo ano! ”.
Os versos que permearam toda a programação da plenária da ASA revelam a arte, que é uma das virtudes do Semiárido, a emoção do reencontro e a força política do povo que acredita que é no Semiárido que a vida pulsa, é no Semiárido que o povo resiste!. Do Semiárido baiano, vieram os versos, recitados pela poeta e pelo poeta da ASA Bahia, Luna Layse e Agnaldo Santos, que resumem a inspiração da ASA para este recomeço. “... Vamos plantar todos juntos, essa semente de amor, espalhe a mensagem, de uma gente de valor, o povo da rede Asa, mostra aqui o seu vigor …”
Escrito por: Por Adriana Amâncio
Publicado originalmente por: ASA Brasil em 31/05
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